Não há nenhum micaelense que não se comova com a toada sentida das orações dos romeiros. Sempre que começa uma nova Quaresma, os caminhos e estradas povoam-se de silhuetas masculinas, vergadas ao peso de uma espiritualidade profunda, percorrendo a ilha de lés-a-lés, em Romarias quaresmais ciosamente mantidas há cinco séculos.

Ao longo destes cinco séculos, as romarias sofreram avanços e recuos, com proibições e restrições motivadas por diversas razões. Verdade seja dita, que enfrentando contrariedades, congregando boas vontades e acima de tudo fazendo valer a força da fé que faz persistir e perseverar há cinco séculos, as nossas romarias chegaram até hoje, com a força e a expressão vivenciadas atualmente na Ilha de São Miguel e por este mundo fora, onde haja um Açoriano.

 

A atual tradição dos Romeiros de São Miguel, que outrora designava-se por visita às casinhas de Nossa Senhora, constituem um fenómeno etnográfico valiosíssimo, não só pela originalidade de certos elementos que lhe são inerentes, mas também pela persistência dessa manifestação ao longo de cinco séculos. Os Romeiros de São Miguel constituem-se por ranchos de peregrinos que, durante uma das semanas da Quaresma, percorrem a pé a ilha do Arcanjo, visitando (quase) todas as igrejas e as ermidas invocadas a Nossa Senhora. Os ranchos representam geralmente uma Paróquia. Os romeiros dispõem atualmente, de uma indumentária muito característica desde as suas raízes, constituída por um xaile pelos ombros, um lenço ao pescoço, uma saca às costas; dois terços (um ao pescoço e outro na mão) e um bordão na mão. O rancho, quando em marcha, adota uma formação convencional constituída por duas alas de romeiros. As alas são compostas pelos romeiros, estando à frente de cada ala os Guias. A ala do meio integra o irmão da Cruz (Cruzado), o Lembrador das Almas, o Contramestre, o Mestre e no fim do rancho o Procurador das Almas.

 

“O segredo de uma boa Romaria está numa boa preparação”, aprendi esta frase com o meu saudoso Mestre Hermínio Sousa. Um aspeto primordial de uma boa preparação é primeiramente “educar o homem, e só depois educar o cristão” frase esta, proferida muitas vezes pelo nosso Padre José Gregório (antigo Pároco de Ponta Garça). A preparação não pode resumir-se aos “ensaios”, diria mesmo, menos ensaios, mais preparação, isto é, mais catequese.

 

Para compreender melhor uma Romaria é necessário experimentá-la, ou melhor, vivê-la. A união, a fraternidade, a partilha e a caridade existentes naquela semana, são completadas pela beleza da natureza presente na nossa ilha. Deus fala-nos pela mãe natureza, e manifesta-se muitas vezes com sinais, muitos deles, vindos da própria natureza, e esta maravilha, leva-nos a uma maior intimidade com Deus.

 

Nós romeiros, não podemos nascer na quaresma e morrer na páscoa. Após uma romaria, é imperativo assumirmos um compromisso diário de verdadeiros romeiros, como “cristãos autênticos” quer no seio familiar, nos nossos ambientes, mas acima de tudo na nossa comunidade cristã, junto das nossas Paróquias, como membros de um movimento ativo e presente, quer em ações sócio-caritativas, na contínua formação cívica e cristã, e acima de tudo na vertente pastoral. Já é tempo de deixarmos de ser chamados “romeiros de oito dias”. É fundamental mantermos bem viva “a chama” que trazemos acesa no final de cada Romaria, porque, depois do ‘estudo’ nas nossas reuniões de preparação e da ‘piedade’ vivida na nossa semana da Romaria, é imperativo haver ‘ação’. “Uma fé sem obras é morta” (S. Tiago).

 

Se um cristão faz o bem, um cristão romeiro deverá “FAZER O BEM, BEM FEITO!”, fruto dos propósitos vividos numa Romaria: a penitência, a oração e a conversão.

 

Neste ano santo e jubilar, cujo tema é precisamente “Peregrinos de Esperança”, convido mais uma vez, todos os ranchos de romeiros a visitarem o SANTUÁRIO DE NOSSA SENHORA DA PAZ, em Vila Franca do Campo, quer na semana de romaria, quer na romaria da vida, durante o ano.

 

Carlos Vieira

Mestre dos Romeiros de Vila Franca do Campo

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