Partilhamos uma entrevista com o Dr. Patrício Ferreira, médico psiquiatra nas Irmãs Hospitaleiras de Braga, que combina uma destacada formação académica com uma vasta experiência profissional na área da saúde mental. Licenciado em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra em 2004, realizou o seu internato geral no Hospital Distrital da Figueira da Foz e a sua especialização em Psiquiatria no Hospital de Braga. A sua carreira inclui mais de uma década como médico assistente em Psiquiatria na Unidade Local de Saúde do Alto Minho e uma fase como professor convidado na Universidade do Minho, onde lecionou o módulo de Saúde Mental.
Atualmente, o Dr. Patrício Ferreira lidera tratamentos inovadores em psiquiatria de intervenção, destacando-se a eletroconvulsoterapia (ECT), uma técnica avançada que revolucionou o tratamento de distúrbios psiquiátricos graves. Esta entrevista explora em profundidade a ECT, os seus benefícios, aplicações e como as Irmãs Hospitaleiras de Braga implementaram uma abordagem integral e humanizada para as pessoas assistidas que a recebem.
O que é a electroconvulsoterapia (ECT) e em que casos é recomendada como tratamento?
A ECT é um tipo de tratamento usado em psiquiatria que se enquadra nas terapias físicas usadas nesta especialidade.
Muito menos difundida e usada que as terapêuticas psicofarmacológicas, foi e ainda é arma de arremesso pelos movimentos antipsiquiatria, talvez por algum uso indevido no passado e pela forma como era administrado.
Nos últimos anos este tratamento tornou-se altamente diferenciado, seguro e eficaz, desde que aplicado nas patologias certas ou com indicação inequívoca para este tipo de tratamento.
O tratamento consiste na aplicação de um estímulo elétrico, sob uma curta anestesia geral, com o objetivo de provocar uma pequena crise convulsiva. São vários os efeitos positivos que têm sido demonstrados na neurotransmissão cerebral, e embora o mecanismo de ação global ainda não seja totalmente conhecido, cada vez mais se sabe sobre os efeitos da ECT no Cérebro.
Embora ainda não seja usada com 1ª linha, e muitos clínicos se lembrem da ECT quando as outras terapias falham, há claras indicações em que este tratamento deve ser das primeiras opções
Um exemplo é a depressão grave, melancólica e com sintomas psicóticos e ou catatonia associada
A catatonia, um sintoma motor que também surge noutras patologias psiquiátricas como a esquizofrenia, também aqui a ECT deve ser considerada prioritariamente.
A depressão na grávida também é uma indicação clássica e que nos prova a segurança deste tratamento.
Porque é que a ECT é utilizada em situações de emergência psiquiátrica, como o risco de suicídio ou na gravidez?
Na comparação com outros tratamentos clássicos farmacológicos para quadros depressivos, a ECT mostra uma maior rapidez de ação e segurança tal, que mesmo na depressão na grávida, é tratamento de eleição, na comparação com o risco benefício do uso de psicofármacos nesta população.
Como é efetuada a ECT e que precauções de segurança são tomadas?
Em primeiro lugar referir o avanço que existiu nos últimos anos nos dispositivos usados na administração do ECT (onda sinusoidal vs onda de pulso breve) e o uso da anestesia geral bem como de outros fármacos que minimizam o impacto negativo que a crise poderia ter no paciente. Para além dos normais cuidados a ter numa administração de uma anestesia geral curta (como por exemplo na realização de um exame endoscópico), não há contraindicações absolutas para a realização do tratamento. São realizados ainda cuidados ao nível da proteção da dentição.
Quais são os benefícios da ECT em comparação com outros tratamentos para as perturbações psiquiátricas?
Sem dúvida a rapidez de ação, mas também a eficácia desde que administrada nas patologias com indicação.
Quais são os efeitos da ECT no cérebro e como é que ajuda a reduzir os sintomas de perturbações como a depressão e a psicose?
Cada vez se tem descoberto mais sobre os efeitos da ECT no cérebro, mas o mecanismo definitivo responsável pela ação terapêutica ainda não é totalmente conhecido. De qualquer forma é consensual o efeito sobre neurotransmissores, recetores sinápticos, secreção de neuropeptídeos) e chegando à expressão gênica e à síntese proteica. Também a teoria neuroendócrina sugere que a ECT atua corrigindo disfunções no eixo hipotálamo-hipófise associadas às tperturbações do humor.
Que outras técnicas inclui a psiquiatria de intervenção para além da terapia electroconvulsiva?
A psiquiatria de intervenção ou de neuromodulação, para além da ECT temos a Estimulação Magnética Transcraneana, A Estimulação Transcraniana por Corrente Elétrica e o uso da escetamina ou ketamina.
Como escolher entre a ECT e outras técnicas de intervenção, como a Estimulação Magnética Transcraniana (EMT)?
Para a maioria dos psiquiatras e consequentemente para os pacientes, o grande fator de escolha ainda é a disponibilidade das técnicas. Nem todos os centros têm disponíveis este tipo de tratamentos. Apesar de tudo a ECT ainda é usado nos casos mais graves de depressão com sintomas psicóticos.
Que resultados obtêm normalmente os doentes submetidos a ECT e quanto tempo demora a registar melhorias?
O resultado clínico do tratamento depende essencialmente do diagnóstico correto prévio e assim da indicação correta para este tipo de tratamento. Se assim for, os resultados são evidentes logo no fim da primeira semana de tratamento. São habitualmente resultados bastante sustentados no tempo ainda que alguns utentes necessitem de tratamento de manutenção, que após a fase aguda de tratamento em que são feitas 3 sessões por semana durante 3 a 4 semanas, podem depois passar depois de uma fase de transição fazer tratamentos mensal por tempo indeterminado
Que avanços se registaram nos últimos anos na utilização de terapias de intervenção para o tratamento de doenças mentais graves?
O foco mais recente tem sido sem dúvida e escetamina que tem mostrado excelentes resultados nos casos de depressão resistente aos tratamentos convencionais. Embora ainda não comparticipado em Portugal, já tem sido usado noutros países europeus com grande impacto na qualidade de vida dos pacientes. Em Portugal, os resultados na população que tem tido acesso ao tratamento têm sido muito positivos e sustentados. O Instituto das Irmãs hospitaleiras é um centro autorizado para a realização desta terapia de intervenção .
Como é que a abordagem hospitaleira das Irmãs Hospitaleiras influência o tratamento e o acompanhamento dos pacientes que recebem Terapia Electroconvulsiva?
A unidade de ECT das Irmãs hospitaleiras de Braga funciona há vários anos e com um número de tratamentos mensal ao nível dos grandes centros psiquiátricos mundiais. É por isso uma Unidade experiente, com uma equipa dotada e capaz de realizar estes tratamentos com grande segurança. Está equipada com tecnologia mais avançada que existe. Toda a equipa esta preparada e vocacionada para envolver os pacientes e familiares no tratamento, explicando o procedimento e tranquilizando-os sobre o mesmo.